"O escritor é uma das criaturas mais neuróticas que existem: ele não sabe viver ao vivo, ele vive através de reflexos, espelhos, imagens, palavras. O não-real, o não-palpável. Você me dizia "que diferença entre você e um livro seu". Eu não sou o que escrevo ou sim, mas de muitos jeitos. Alguns estranhos."

Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

"As estrelas são os olhos de Deus"





"Quanto à mim,
tenho que lhes dizer
que as estrelas são os

olhos de Deus vigiando
para que tudo corra bem.

Para sempre. E, como se sabe,
sempre NÃO ACABA NUNCA."



Clarice Lispector

"Sobre todos aqueles que continuam tentando, Deus, derrama teu Sol mais luminoso."



"Não quero dramatizar e fazer dos problemas reais monstros insolúveis, becos-sem-saída.  Nada é muito terrível. Só viver, não é?
A barra mesmo é ter que estar vivo e ter que desdobrar, batalhar um jeito qualquer de ficar numa boa."

Como dizia Clarice Lispector arrematando A hora da estrela e a sua própria vida: “Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos. Sim.”

Caio Fernando Abreu


sábado, 26 de novembro de 2011

"Vamos fazer assim. Sem traumas. Sem dramas. Sem dores." Gabito Nunes



"(...) pois estou aqui para dizer que até a tristeza pode tornar um dia especial. Só que não ficaremos sabendo disso na hora, e sim lá adiante, naquele lugar chamado futuro, onde tudo se justifica."


Martha Medeiros

-Será mesmo!?-

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

"O trágico não vem a conta-gotas." Guimarães Rosa



"Me mande mentalmente coisas boas. Estou tendo uns dias difíceis."

Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

"Hoje é dia de mudar de casa, de rua, de vida."



"As malas sufocam os corredores. Pelo chão restam plumas amassadas, restos de purpurina, frangalhos de echarpes indianas roubadas, pontas de cigarro (Players Number Six, o mais barato). Chico toca violão e canta London, London: no, nowhere to go. Poucos ainda sorriem e olham nos olhos. Hoje é dia, mais uma vez, de mudar de casa e de vida. Os olhos buscam signos, avisos, o coração resiste (até quando?) e o rosto se banha de estrelas dormidas de ontem, estrelas vagabundas encontradas pelas latas de lixo abundantes de London, London, Babylon City. Alguém pergunta: “O que é que se diz quando se está precisando morrer?” Eu não digo nada, é a minha resposta. Sento no chão e contemplo os escombros de Sodoma e Gomorra: brava Bravington Road, bye, bye.
Amanhã é dia de nascer de novo. Para outra morte. Hoje é dia de esperar que o verde deste quase fim de inverno aqueça os parques gelados, as ruas vazias, as mentes exaustas de bad trips. Hoje é dia de não tentar compreender absolutamente nada, não lançar âncoras para o futuro. Estamos encalhados sobre estas malas e tapetes com nossos vinte anos de amor desperdiçado, longe do país que não nos quis. Mas amanhã será quem sabe o acerto de contas e Jesuzinho nos pagará todas as dívidas? Só que já não sei se ainda acredito nele. Tão completamente sento e espero que quase acredito ir além deste estar sentado no meio de escombros, here and now esperando Zé chegar com a noticia de que conseguiu a casa graças aos poderes de Jack na região de Victoria, Pimlico. Só espero, não penso nada. Tento me concentrar numa daquelas sensações antigas como alegria ou fé ou esperança. Mas só fico aqui parado, sem sentir nada, sem pedir nada, sem querer nada.
As crianças sujas e ranhentas da casa ao lado vêm perguntar se somos ciganos: are you gipsies? Sylvia mente que sim —from Yugoslavia, diz, agita no ar o pandeirinho com fitas e finge dançar e ler as linhas das mãos das crianças. Gosto tanto desse jeito que Sylvia tem de aliviar as coisas. Meu coração vai batendo devagar como uma borboleta suja sobre este jardim de trapos esgarçados em cujas malhas se prendem e se perdem os restos coloridos da vida que se leva. Vida? Bem, seja lá o que for isto que temos..."

Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Guimarães Rosa e suas "Lindezas"

"Rezar muito. E ter fé. Porque as coisas estão todas amarradinhas em Deus."



"Sigo à risca. Me descuido e vou. Viver não é  perigoso? Então, com sua licença!"



"É preciso sofrer depois de ter sofrido, e amar, e mais amar, depois de ter amado."


"Infelicidade é uma questão de prefixo."




"E senti um amor imenso. Por tudo, sem pedir nada de volta."



"Ando apaixonado por viver, com tudo que isso implica."

Caio Fernando Abreu

"Eu desperto, e digo sim. E tudo recomeça" Caio F.



"Cada um de nós mereceria ao menos uma reportagem para homenagear nossos dons mais secretos, aqueles que acontecem bem longe dos holofotes. O dom de viver sem aplauso e sem platéia. O glorioso e secreto dom de vencer os dias."

Martha Medeiros

"E enquanto eu te via nascia um jardim nas minhas faces"



Leonardo Kodama ♥ 
"With every kiss, our love is like brand-new

And every star up in the sky
Was made for me and you
Still we both know that the road is long
We know that we will be together
Because our love is strong


I finally found the love of a lifetime
A love to last my whole life through
I finally found the love of a lifetime
Forever in my heart
I finally found the love of a lifetime"

FireHouse

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

"Tenho dias lindos, mesmo quietinhos"



"Temos esperanças novinhas em folha, todos os dias. E nenhuma, fora de viver cada vez mais plenamente, mais confortáveis dentro do que a gente, sem culpa, é."


Caio Fernando Abreu




Se só tens risori-te!

Machado de Assis


Das Ilusões





"Meu saco de ilusões, bem cheio tive-o.
Com ele ia subindo a ladeira da vida.
E, no entretanto, após cada ilusão perdida...
Que extraordinária sensação de alívio!"


                                              Mário Quintana

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

"Cheiro pingado, respingado, risonho, cheiro de alegriazinha..." Guimaraes rosa



"Eu só quero celebrar as minhas flores de dentro."
Marla de Queiroz




"Em cada canto da casa, um riso. Em cada riso, uma vontade de eternidade."


Cris Carvalho

"E decidi que a vida logo me daria tudo, se eu não deixasse que o medo me apagasse no escuro" Tiê



"Ouça um bom conselho
Que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança
Venha, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com meu fogo
Venha se queimar
Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar
Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que não se vai longe
Eu semeio o vento
Na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade"

Chico Buarque 

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

"É difícil manter os pés no chão enquanto a mente voa." Lucas Silveira



"Estou cheia de acácias balançando amarelas, e eu que mal e mal comecei a minha jornada, começo-a com um senso de tragédia, adivinhando para que oceano perdido vão os meus passos de vida. E doidamente me apodero dos desvãos de mim, meus desvarios me sufocam de tanta beleza."

Clarice Lispector

terça-feira, 18 de outubro de 2011

"Mesmo com o todavia, Com todo dia, Com todo ia, Todo não ia.. A gente vai levando." Chico Buarque



"Se a gente puder ir devagarinho como precisa, e ninguém não gritar com a gente para ir depressa demais, então eu acho que nunca que é pesado."

Guimarães Rosa

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

"O tempo deveria ter o ritmo dos nossos passos..



...Horas a menos para dias de trabalho exaustivo,  minutos a mais para um café e idéias em ordem, um tempo maior para edredom, frio e pernas emboladas, horas perdidas no aconchego dos braços, pouco tempo para gente que não te acrescenta em nada, muito tempo para beijos melados de balas, tempo em câmera lenta para contar estrelas, dias inteiros para sentar no parque, ler um livro, falar com os amigos. Quero pantufas de minutos confortáveis."


                                                   Martha Medeiros

"É possível acariciar as pessoas com palavras." Francis Scott F.



"Eu peço à Palavra que me dê o seu poder de relatar  ou inventar belezas ou uma delicadeza qualquer que surpreenda e faça sorrir" 


Marla de Queiroz

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

"Uma convicção: 





Amor é delicadeza..."



Cristiana Guerra 

"Todo dia, enfrente pelo menos uma coisa que te meta medo de verdade."



"Eu sofro de mimfobia, tenho medo de mim mesmo. Mas me enfrento todo dia." 


Millôr Fernandes

"Viver é etcétera." Guimarães Rosa



"Não importa se a estação do ano muda… Se o século vira, se o milênio é outro. Se a idade aumenta… Conserva a vontade de viver, Não se chega a parte alguma sem ela."


Fernando Pessoa

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Vinho, poesia ou virtude



"É preciso estar sempre embriagado. Eis aí tudo: é a única questão. Para não sentirdes o horrível fardo do Tempo que rompe os vossos ombros e vos inclina para o chão, é preciso embriagar-vos sem trégua.
Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa maneira. Mas embriagai-vos.E se, alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre a grama verde de um precipício, na solidão morna do vosso quarto, vós acordardes, a embriaguez já diminuída ou desaparecida, perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que foge, a tudo que geme, a tudo que anda, a tudo que canta, a tudo que fala, perguntai que horas são; e o vento, a onda, a estrela, o pássaro, o relógio, responder-vos-ão: 'É hora de embriagar-vos! Para não serdes os escravos martirizados do Tempo, embriagai-vos: embriagai-vos sem cessar! De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa maneira'."

                                               Charles Baudelaire

"Querer-bem não tem beiradas."



"Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura."




"Felicidade se acha é em horinhas de descuido"

Guimarães Rosa e suas lindezas

terça-feira, 27 de setembro de 2011

"Ninguém sabe direito o que é felicidade, mas, definitivamente, não é acomodação." Martha Medeiros




"Não basta sentir a chegada dos dias lindos.  É necessário proclamar: "Os dias ficaram lindos"."

                                                                              Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 26 de setembro de 2011



"Tudo o que gosto tem sabor de pecado,  é feio, censurado, imoral, fora da Lei,  engorda e faz mal pra saúde."

Maysa

"Todo mundo quieto em volta. Aí resolvi calar a boca. Afinal, como na fábula do lobo e do cordeiro: contra a força não há argumentos"



"Mas ando de saco muito cheio com essas coisas. De repente tô trabalhando num lugar que me obriga a ir contra tudo que penso e sinto. Não sei como resolver tudo isso. Mas tudo bem, tô calmo e ponderado, embora a vontade seja de agredir todo mundo, dizer meia dúzia de verdades e sair pisando duro. Não vou fazer nenhuma loucura."

Caio Fernando Abreu

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

"De cada dia arrancar das coisas, com as unhas, uma modesta alegria; em cada noite descobrir um motivo razoável para acordar amanhã."



"Porque já não temos mais idade para, dramaticamente, usarmos palavras grandiloqüentes como "sempre" ou "nunca". Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a continuidade da vida, das pessoas e das coisas. Já não tentamos o suicídio nem cometemos gestos tresloucados. Alguns, sim - nós, não. Contidamente, continuamos. E substituímos expressões fatais como ‘não resistirei’ por outras mais mansas, como "sei que vai passar". Esse o nosso jeito de continuar, o mais eficiente e também o mais cômodo, porque não implica em decisões, apenas em paciência."

Caio Fernando Abreu

"Acordo com a voz safada de Cazuza repetindo em minha orelha fria: - " quem tem um sonho não dança, meu amor"." Caio F.






"Mas a gente vai à luta e inventa um novo sonho, uma esperança, mesmo recauchutada: vale tudo, MENOS CHORAR TEMPO DEMAIS. Pois sempre há coisas boas para pensar. Algumas se realizam."

                                             Lya Luft

sábado, 10 de setembro de 2011

"Nem sempre é "so easy" se viver" Lulu Santos



"Fico tão cansada às vezes, e digo para mim mesma que está errado, que não é assim, que não é este o tempo, que não é este o lugar, que não é esta a vida. E fumo, então, fico horas fumando sem pensar absolutamente nada: disseram-me uma vez que os discos voadores costumam aparecer ao crepúsculo, mas nunca consegui ver um, me pergunto se eles só se mostram para quem de certa forma está preparado, os tais escolhidos, e confesso que fico um pouco ofendida ao supor que não seja uma das escolhidas, você me entende? Claro, é preciso julgar a si próprio com o máximo de rigidez, mas não sei se você concorda, as coisas por natureza já são tão duras para mim que não me acho no direito de endurecê-las ainda mais."

Caio Fernando Abreu

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Dois ou três almoços, uns silêncios





Fragmentos disso que chamamos de "minha vida".





"Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.

Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: Mas ambos estavam comprometidos.Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia.Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome."


Caio Fernando Abreu
Publicado no jornal "O Estado de S. Paulo", 22/04/1986

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

"Descobrir o verdadeiro sentido das coisas é querer saber demais. Querer saber demais."




"Tem beijo que parece mordida
Tem mordida que parece carinho
Tem carinho que parece briga
Tem briga que aparece pra trazer sorriso
Tem riso que parece choro
Tem choro que é por alegria
Tem dia que parece noite
E a tristeza parece poesia"
O Teatro Mágico 

"Precisava sair daqui. Deste planeta que, tão freqüentemente, parece não comportar a sensibilidade."



"Perdoem o silêncio, o sono, a rispidez, a solidão. Está ficando tarde, e eu tenho medo de ter desaprendido o jeito. É muito difícil ficar adulto."

Caio Fernando Abreu 

quarta-feira, 24 de agosto de 2011



"Acontece que entre ainda-não-é-hora e nossa-hora-chegou, muita gente se perde. Não se perca viu!"

Caio Fernando Abreu

terça-feira, 23 de agosto de 2011

"Um jeito de quem pisa mesmo em luas, não em pedras."




"Eram bonitos juntos, diziam as moças. Um doce de olhar.Sem terem exatamente consciência disso,quando juntos os dois aprumavam ainda mais o porte e,por assim dizer, quase cintilavam,o bonito de dentro de um estimulando o bonito de fora do outro, e vice-versa.Como se houvesse entre aqueles dois,uma estranha e secreta harmonia."

Caio Fernando Abreu

Mania de explicação



Era uma menina que gostava de inventar uma explicação para cada coisa.

Explicação é uma frase que se acha mais importante do que a palavra.
As pessoas até se irritavam, irritação é um alarme de carro que dispara bem no meio de seu peito, com aquela menina explicando o tempo todo o que a população inteira já sabia. Quando ela se dava conta, todo mundo tinha ido embora. Então ela ficava lá, explicando, sozinha.
Solidão é uma ilha com saudade de barco.
Saudade é quando o momento tenta fugir da lembrança pra acontecer de novo e não consegue.
Lembrança é quando, mesmo sem autorização, seu pensamento reapresenta um capítulo.
Autorização é quando a coisa é tão importante que só dizer "eu deixo" é pouco.
Pouco é menos da metade.
Muito é quando os dedos da mão não são suficientes.
Desespero são dez milhões de fogareiros acesos dentro de sua cabeça.
Angústia é um nó muito apertado bem no meio do sossego.
Agonia é quando o maestro de você se perde completamente.
Preocupação é uma cola que não deixa o que não aconteceu ainda sair de seu pensamento.
Indecisão é quando você sabe muito bem o que quer mas acha que devia querer outra coisa.
Certeza é quando a idéia cansa de procurar e pára.
Intuição é quando seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.
Pressentimento é quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.
Renúncia é um não que não queria ser ele.
Sucesso é quando você faz o que sempre fez só que todo mundo percebe.
Vaidade é um espelho onisciente, onipotente e onipresente.
Vergonha é um pano preto que você quer pra se cobrir naquela hora.
Orgulho é uma guarita entre você e o da frente.
Ansiedade é quando faltam cinco minutos sempre para o que quer que seja.
Indiferença é quando os minutos não se interessam por nada especialmente.
Interesse é um ponto de exclamação ou de interrogação no final do sentimento.
Sentimento é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.
Raiva é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes.
Tristeza é uma mão gigante que aperta seu coração.
Alegria é um bloco de Carnaval que não liga se não é fevereiro.
Felicidade é um agora que não tem pressa nenhuma.
Amizade é quando você não faz questão de você e se empresta pros outros.
Decepção é quando você risca em algo ou em alguém um xis preto ou vermelho.
Desilusão é quando anoitece em você contra a vontade do dia.
Culpa é quando você cisma que podia ter feito diferente, mas, geralmente, não podia.
Perdão é quando o Natal acontece em maio, por exemplo.
Desculpa é uma frase que pretende ser um beijo.
Excitação é quando os beijos estão desatinados pra sair de sua boca depressa.
Desatino é um desataque de prudência.
Prudência é um buraco de fechadura na porta do tempo.
Lucidez é um acesso de loucura ao contrário.
Razão é quando o cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.
Emoção é um tango que ainda não foi feito.
Ainda é quando a vontade está no meio do caminho.
Vontade é um desejo que cisma que você é a casa dele.
Desejo é uma boca com sede.
Paixão é quando apesar da placa "perigo" o desejo vai e entra.
Amor é quando a paixão não tem outro compromisso marcado. Não. Amor é um exagero... Também não. É um desadoro... Uma batelada? Um enxame, um dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um descontrole, uma necessidade, um desapego? Talvez porque não tivesse sentido, talvez porque não houvesse explicação, esse negócio de amor ela não sabia explicar, a menina.
                                                                Adriana Falcão